O Sínodo da Palavra pede que sejamos 'amigos da Palavra' que cresçamos no relacionamento e no amor para com as Escrituras. O amigo sempre lembra o outro. Nós devemos sonhar acordar e caminhar com a Palavra, pois 'Deus nos fala como amigos'. Precisamos de uma relação profunda, uma experiência pessoal com as Escrituras. Quem é amigo da Palavra, dá-lhe centralidade, primazia, importância. Descobrimos pela Palavra que Deus é nosso amigo, aliado, parceiro, confidente. Nela ele dá-Se a conhecer, comunica seu amor, revela sua vida íntima, ouve e responde, fala de modo humano. Quando ouvimos a Palavra amiga, nossos corações ardem de amor e se deixam traspassar de comoção.
Quem é amigo da Palavra adquire um coração bíblico e sempre tem mais fome e sede das Escrituras. Os amigos Palavra crescem na familiaridade, no apego, na paixão, no conhecimento da Sagrada Escritura. Deixemo-nos conquistar pela Palavra. Quem é amigo da Palavra percebe melhor o pecado contra ela que consiste em não ouvir, não escutar, rejeitar, desobedecer, ser surdo, romper o diálogo da aliança. 'Veio para o que era seu e os seus não O receberam' (Jo 1,11). Todos os que O receberam se tornaram filhos de Deus. Portanto, resistência, teimosia, orgulho, fechamento, surdez, incredulidade, dureza de coração, desobediência são pecados contra a palavra.
Como amigos da Palavra precisamos evitar sempre o racionalismo e o misticismo bíblicos. Os racionalistas exageram o lado humano e científico da Palavra e os adeptos do misticismo recusam a ciência bíblica e preferem só o lado espiritual. Não deve haver ruptura entre o humano e o divino, entre a ciência e a fé, entre o sentido literal e o sentido espiritual da Bíblia. Aqui devemos seguir a lei da encarnação: Jesus é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. A Palavra de Deus é também divina e humana.
A maior prova de amizade com a Palavra é a interiorização, vivência, assimilação das Escrituras. Quem não vive o que ensina é um surdo-mudo, divulga uma letra morte, prega só com os lábios e assim emudece a Palavra. Todo amigo da Palavra permite que ela se faça carne na sua pessoa e evitará uma leitura tediosa, apressada, mal preparada da mesma. Os amigos da Palavra sabem silenciar e escutar, praticar e pregar as Sagradas Escrituras. Assim, Deus tem a primeira e última palavra em suas vidas. Jesus, o Verbo que se fez carne. Ele abriu o livro em Nazaré e encontrou a confirmação do seu ministério nas Escrituras. A própria Palavra abriu. Tenhamos a Bíblia na mão, no coração e pés na missão.
É preciso enfrentar as deficiências bíblicas da Igreja, a saber, pouco acesso à Palavra, ignorância bíblica, comunicação inadequada da Palavra, desconhecimento e dificuldade com o Antigo Testamento, incoerência entre pregação e vida, pregação superficial, distância entre os estudiosos da Bíblia e os pastores e o povo. Peçamos perdão por nossas fragilidades bíblicas. Nosso tempo é de uma nova escuta e nova responsabilidade com a Palavra, pois o cristianismo é 'religião da Palavra'. Sempre podemos ver ouvir, tocar, contemplar o verbo da vida nas Escrituras. Como Maria devemos dizer: 'Faça-se em mim segundo tua Palavra'.
Como Paulo devemos confessar: 'Faço tudo pelo Evangelho'. A exemplo de Pedro devemos proclamar: 'Sob tua Palavra lançarei as redes'. Com São João repetimos 'só Tu tens palavras de vida eterna'. Temos tantas oportunidades bíblicas que são chances de experiência com a Palavra, a saber: o éfeta do batismo, a oração do rosário, a via crucis, o sinal da cruz antes da proclamação do Evangelho, as romarias, os retiros, a religiosidade popular, os grupos bíblicos, a liturgia das horas, os subsídios bíblicos, a Terra Santa, as celebrações litúrgicas, especialmente a Eucaristia e o domingo. Tudo isso é nossa responsabilidade e amizade com a Palavra. Os amigos da Palavra descobrem que ela tem uma voz: a revelação divina; tem um rosto: Jesus de Nazaré; tem uma casa: a Igreja; e tem um caminho: as missões.
Dom Orlando BrandesArcebispo de Londrina
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